Quase três anos após o prazo estabelecido pela Constituição para ampliar a presença da Defensoria Pública da União (DPU) em todo o território nacional, cerca de 70 milhões de pessoas continuam sem acesso regular à justiça – segundo dados do último ano levantados pelo órgão e entidades ligadas às defensorias. A falta de recursos é o principal gargalo: o orçamento da DPU representa apenas 0,04% do total de despesas da União em 2024, o correspondente a R$ 3,33 por habitante.
Em junho de 2014, a Emenda Constitucional nº 80 estipulou prazo de oito anos para que a DPU estivesse presente em todos os cantos do país e que todas as unidades jurisdicionais contassem com um defensor. A meta, no entanto, está longe de ser alcançada. Das 276 subseções da Justiça Federal no país, apenas 78 contam com atendimento regular da DPU, o que representa menos de 30% da cobertura necessária.
“O resultado são populações vulneráveis, como indígenas, quilombolas e trabalhadores rurais, desassistidos e sem apoio jurídico para reivindicar seus direitos básicos”, explica a presidente da Associação Nacional de Defensoras e Defensores Públicos Federais (Anadef), Luciana Grando Bregolin.
A crise orçamentária enfrentada pela DPU afeta todas as regiões brasileiras. Segundo o levantamento sobre o órgão, apenas 11 unidades federativas possuem cobertura total da Defensoria em suas comarcas. Das 2.565 comarcas instaladas por todo o país, somente 1.315 são regularmente atendidas pela Defensoria Pública, representando 51,3%.
Em estados como São Paulo, Bahia, Piauí e Paraná, por exemplo, o atendimento é restrito a demandas criminais ou áreas específicas. Goiás é o estado com menor cobertura do país, atingindo apenas 40,4% da população.
Para se ter uma ideia da escassez, atualmente existem apenas 697 defensores públicos federais em todo o país. Isso porque o orçamento reduzido restringe a abertura de novas vagas em concursos, dificultando o preenchimento dos 572 cargos atualmente vagos.
Outro problema decorrente da baixa cobertura da DPU é a necessidade de contratar advogados dativos — profissionais nomeados por um juiz para atuar em processos judiciais de pessoas que não podem pagar. Segundo a pesquisa, 78,6% dos estados usam essa alternativa, muito mais cara.
“O custo anual seria de R$ 153,7 bilhões a mais do que o gasto atual com as Defensorias. Ou seja, um maior investimento na estruturação da Defensoria Pública também resultaria em economia para os cofres públicos”, comenta Luciana.